Diário da Gilmara na Irlanda
Como já descrevi no episódio anterior os primeiros dias de 2018 vieram carregados de muitos acontecimentos e fortes emoções. Eu estava num ritmo frenético de muito trabalho, estudos e tirando tempo ainda para a vida social. Só estava difícil manter uma rotina de sono e alimentação saudável nesse período. Acho que a palavra “intenso” já se tornou comum no meu diário e na vida de qualquer intercambista e um adulto vai estar sempre ajustando suas batalhas e vitórias.
Enquanto em uma semana eu conseguia dar conta de “tudo” na medida do possível, na outra muitos altos e baixos. Mas desistir jamais! Em fevereiro, surgiu um compromisso especial: o casamento da minha amiga que seria em outra cidade e eu seria a madrinha. Era uma ocasião que eu não poderia perder por nada no mundo, e assim, mesmo com a agenda apertada, me organizei tanto para os preparativos e compra do vestido quanto para estar presente e celebrar esse momento único ao lado de amigos e familiares.
Foram quase 5 horas de viagem de ônibus e eu não sei se já comentei aqui, mas eu sempre fico enjoada andando de qualquer transporte terrestre nesse país. Eu não sei se são as montanhas, as curvas, o ar, mas é sempre um desafio pegar a estrada. Preciso de medicação para sobreviver o percurso. Que, no fim, claro, valeu muito a pena. Donegal é uma cidade linda e todo o ritual do casamento na igreja e a recepção no salão de festas do hotel completaram esses três dias maravilhosos.
E como se esse evento metade brasileiro e metade irlandes já não trouxesse doses suficientes de emoção, passados alguns dias, a Irlanda decidiu surpreender a todos com uma tempestade de neve, um dos piores fenômenos climáticos vistos em quase 36 anos. Foi uma onda de frio siberiana chamada de “Besta do Leste”, em que o sul da Irlanda e do Reino Unido foram afetadas pela Tempestade Emma. Isso causou o bloqueio de estradas, cancelamento de voos e circulação de trens.
Mas para quem nunca tinha vivenciado esse clima, o cenário estava digno de conto de fadas, com tudo branquinho, e os acúmulos de neve que chegaram até 90 cm em alguns pontos do país. A cidade entrou em estado de alerta vermelho, recomendando que as pessoas ficassem em casa já que as temperaturas estavam negativas e como a cidade não tem muito preparo para esse tipo de situação o recomendado era evitar ao máximo se expor ao perigo de deslizamento/acidentes fora de casa, principalmente quem dirige.
Eu e minhas amigas estavámos todas de folga já que os trabalhos e aulas foram cancelados. Então não resistimos e resolvemos fazer o oposto da recomendação do governo, não íamos deixar essa oportunidade única passar. Trocamos o conforto do nosso lar, vestimos nossas roupas mais quentes e saímos para explorar a paisagem transformada pela neve. Com os pés afundando na neve fofa, construímos bonecos de neve no parque e deixamos nossas marcas no chão com anjinhos feitos no gelo.
Teve até quem se aventurasse a deslizar por pequenas montanhas de neve e a verdade é que viramos crianças de novo. Foram dias de muita diversão e que nos fez esquecer temporariamente das preocupações do dia a dia e repor as energias. Porque também aproveitamos para descansar, assistir filmes. Isso durou uns três dias, porque já no quarto dia as temperaturas aumentaram e o que sobrou foi muita neve derretida e em algumas partes ainda com risco de deslizamento. E assim com cuidado começamos a voltar a vida “normal”.
Por Gilmara Bezerra