Diário da Gilmara na Irlanda
Depois das viagens incríveis, o que muita gente não sabe é que por detrás dessas aventuras, nos “bastidores”, eu tava com um problemão para resolver. Eu e meus 11 housemates (companheiros de casa) fomos “convidados” a nos retirar do nosso apartamento. O landlord (locator/ dono da casa) pediu a casa com a justificativa de que precisava fazer uma reforma. Era quase dezembro e pelo que me lembro do desespero que sentimos na hora que recebemos a notícia é que teríamos bem pouco tempo para nos mudarmos.
Estávamos todos longe de nossas famílias, estava congelando lá fora e a proximidade das festas de fim de ano tornava a situação ainda mais desafiadora. A saudade de casa, somada à incerteza de encontrar um novo lugar para morar e até do nosso futuro na Irlanda, criou um clima de tensão no ar. Uma atmosfera totalmente diferente do ano anterior. Enquanto o espírito natalino brilhava lá fora, a gente tentava encontrar forças e sentido para nossa realidade.
No entanto, não havia muito tempo para chorar e reclamar ou até mesmo fazer planos para as celebrações. A missão agora era encontrar uma nova casa que “milagrosamente” pudesse abrigar 12 pessoas ansiosas de uma vez só ou era cada um por si para achar o seu teto seguro. E essa segunda opção era claro a mais provável de acontecer, por mais unidos e dispostos a conviver uns com os outros novamente, achar uma casa/apartamento pronto pra receber todos assim de uma hora para outra seria quase impossível.
A Irlanda em 2017 já mostrava sinais de instabilidade no setor imobiliário. Já estava difícil achar moradia pela região central e com um preço que um estudante poderia pagar. E essa escassez fez com que as nossas buscas fossem ainda mais complicadas porque afinal éramos um grupo grande precisando de um lar no mesmo período. Os grupos de Facebook e WhatApp eram as principais fontes de procura, além dos sites oficiais de aluguel de casa.
Imagina competir com nossos próprios housemates por uma vaga? Cada anúncio era uma corrida contra o tempo. A aflição era palpável, mas também havia um senso de solidariedade entre nós. Nos ajudávamos mutuamente, compartilhando informações e priorizando os posts conforme recebíamos respostas dos locadores. Muitos abriam mão de uma vaga para o outro porque podia ficar na casa de um amigo pra ganhar tempo.
Eu fui uma delas. Por muita sorte e por ter amigas maravilhosas que sempre ajudavam uma a outra, tive a opção de ficar na casa delas, dormir no sofá se eu não encontrasse uma vaga antes do meu prazo acabar. E pelo o que tudo indicava era o que ia acontecer porque não estava achando nenhum lugar e meus outros amigos precisavam se mudar com mais urgência e as meninas disseram que eu podia ficar lá pelo tempo que precisasse, só ajudar nas contas e tudo certo.
Não era o ideal “morar” em um sofá e fazer da sala/cozinha das meninas o meu quarto. Pra mim seria muito inconveniente da minha parte e desconfortável, mas a curto prazo e pensando em conviver com elas, estar mais perto, a ideia não parecia tão absurda. E acabou virando realidade. Me mudei para casa delas bem antes do prazo por segurança mesmo e medo de deixar tudo para cima da hora. Afinal mudança já é um estresse e em meio ao caos de gente arrumando malas foi o melhor que pude fazer por mim naquele momento.
Era o fim da casa 368. O fim dos 12 “malucos” dividindo um espaço minúsculo, mas que era o nosso lar, o nosso refúgio no final de um dia cansativo. Nos acostumamos em ser uma “família” grande. Difícil descrever o sentimento dessa separação por causa das circunstâncias que elas aconteceram. Fomos obrigados a sair. Não escolhemos ter que nos mudar naquele dia. E para muita gente esse episódio foi um “divisor de águas” na vida… Continua…
Por Gilmara Bezerra